sábado, 18 de agosto de 2007

Psicologia do contrário

Ana Beatriz, minha netinha de 1 ano e 9 meses, não gosta de comer. Todos em casa sofremos com a falta de apetite dela. Quando queremos que ela se alimente pelo menos um pouquinho, apelamos para a psicologia do contrário. Eu falo para ela: “Ana Beatriz, NÃO coma!” Ela faz uma cara sapeca de menininha teimosa e se dana a comer a sopa, a vitamina ou o que a sua aflita mãe prepare. Come tudo e ainda fica com ar de satisfeita.
A psicologia do contrário bem que poderia funcionar para a humanidade como um todo.
Começaríamos por institucionalizar o roubo, a corrupção, a violência, a deslealdade, a ganância e todos os inumeráveis males que nos infelicitam. O governo faria campanhas de incentivo aos delitos - dos menores aos mais graves. Gordas verbas publicitárias seriam gastas para motivar a população à prática indiscriminada do mal. Ao mesmo tempo, leis, decretos e medidas provisórias seriam elaboradas proibindo a prática das virtudes. Só pra começar, seria proibido ser feliz; imputariam penas graves para quem praticasse a caridade, a honestidade e qualquer ação que tivesse como alvo o bem do próximo.
Em pouco tempo as pessoas começariam a se incomodar com essas medidas. Veríamos surgir nos morros e favelas, o tráfico de gentilezas; nas fronteiras, a solidariedade seria contrabandeada; nas classes abastadas, começariam a praticar a distribuição de bens de primeira necessidade. Os políticos articulariam manobras para aplicar com eficiência as verbas da União e os governantes se apressariam para, sorrateiramente, melhorar as condições da saúde, educação e transportes para a população. Gangs se organizariam para praticar atos de extrema bondade e haveria desvios e mais desvios de verbas para os serviços essenciais.
O Bem seria uma contravenção que todos praticariam.
Quem leu esse texto até aqui, deve estar pensando que sou um maluco, um visionário, um delirante utópico que não conhece a medida da realidade. Argumentariam que a realidade é o mal, o egoísmo, a cupidez, a ganância, a traição, a violência...
Mas por que a realidade não pode ser o outro lado? Por que valorizamos tanto os atos negativos em detrimento dos positivos? Por que temos que aceitar como normal a anormalidade? Por que somos privados até de elaborar mentalmente um mundo melhor, mais justo, humano e fraterno? Por que estamos perdendo até a capacidade de sonhar?
Continuarei sonhando, mesmo que digam não. Continuarei acreditando, mesmo que digam não.
Quem sabe se não estão fazendo comigo, a psicologia do contrário?!

Paulo Moura

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